Apesar de fazer concessões em pontos polêmicos para conquistar apoio na Câmara, o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) manteve em seu relatório na comissão especial o eixo central da reforma da Previdência apresentada pelo governo Jair Bolsonaro. Pilares como a idade mínima para se aposentar, fórmula de cálculo para obtenção de benefício e uma transição em dez anos, mas com variadas regras sem atingir um grande número de trabalhadores, estão preservados. O texto foi divulgado ontem em Brasília.
A comissão especial analisa a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) elaborada pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes. A idade mínima ficou em 65 anos, se homem, e 62 anos, se mulher, tanto para a iniciativa privada (Regime Geral de Previdência Social) como para o setor público (Regime Próprio de Previdência Social).
Em relação aos trabalhadores ligados ao regime geral, atendidos pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), as regras de cálculo do benefício com base na média salarial seguem mais rígidas, como queria o governo. Hoje, o valor da aposentadoria é calculado com base na média dos 80% maiores salários desde julho de 1994 – os 20% menores são descartados.
Se a reforma for aprovada no Congresso como está, a média será calculada sobre 100% dos salários desde o início do Plano Real. A regra diminui de 20% a 30% a renda de quem vai se aposentar.
O advogado Rômulo Saraiva diz que a nova versão da reforma concentra a essência do texto original do governo. “Forma de cálculo, limite etário, regra de transição e regra de cumulação praticamente não tiveram impacto”, diz.
Entre as concessões feitas pelo relator estão retirada da capitalização da proposta, preservação das regras atuais do BPC (benefício para idosos carentes) e regras mais amenas para trabalhadores rurais. Foi garantido ainda um tempo de contribuição menor para as mulheres conseguirem o benefício. Atendendo a um pedido da bancada feminina, o relator propôs alívio para trabalhadoras do setor privado.
Em vez aumentar o tempo mínimo de contribuição para 20 anos, esse período recuou para 15 anos. Para os homens, os 20 anos foram mantidos.
“Do ponto de vista das mulheres, é uma medida correta, mas acho que deveria ter trazido a mesma regra para os homens”, diz Clemente Ganz Lucio, do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos).
TRANSIÇÃO
A transição – que contém critérios para a concessão de benefícios daqueles que estão próximos de se aposentar- também teve mudanças.No caso da iniciativa privada, já havia três sistemas. Moreira criou uma fórmula adicional. No caso do funcionalismo, Bolsonaro propôs apenas uma regra. Com a de Moreira, são duas transições.
A medida reduziu a economia com a reforma em cerca de R$ 100 bilhões. Porém, o especialista em cálculos previdenciários Newton Conde minimiza o impacto na arrecadação e diz que não há efeito significativo em relação a possíveis vantagens para trabalhadores.
“Antes de atingir os critérios que estão no relatório, o segurado provavelmente já vai ter o direito à aposentadoria por meio de uma das transições propostas pelo governo”, afirma Conde.
O relatório apresentado por Moreira também acaba com a possibilidade de punir juízes e procuradores com aposentadoria compulsória.
PRINCIPAIS MUDANÇAS NO TEXTO
Idade mínima para trabalhador urbano
Proposta do governo: a idade mínima de 62 anos para mulheres e de 65 anos para homens após o período de transição, com tempo mínimo de contribuição de 20 anos para ambos os sexos.
Relatório: idades mínimas mantidas, com tempo de contribuição de 20 anos para homens e 15 anos para as mulheres.
Capitalização
Proposta do governo: Constituição viria com autorização para lei complementar que instituirá o regime de capitalização.
Relatório: proposta retirada.
Benefício de Prestação Continuada (BPC)
Proposta do governo: idosos de baixa renda receberiam R$ 400 a partir dos 60 anos, alcançando um salário mínimo somente a partir dos 70.
Relatório: proposta retirada, com manutenção de um salário mínimo para idosos pobres a partir dos 65 anos.
Estados e municípios
Proposta do governo: PEC valeria automaticamente para servidores dos estados e dos municípios, sem necessidade de aprovação pelos Legislativos locais.
Relatório: retirada de estados e municípios da PEC, com a possibilidade de reinclusão dos governos locais por meio de emenda na comissão especial ou no Plenário da Câmara.