sexta-feira, 3 maio 2024

De flanelinha a presidente da Câmara

“Esse sofrimento não vai sair mais de mim, ficou impregnado, virou aprendizado, e agora vai me ajudar a lidar com as buchas aqui dentro”. Essa frase foi dita pelo novo presidente da Câmara de Americana, Thiago Martins (PV), dentro do gabinete da presidência, recém-ocupado por ele. O sofrimento ao qual ele se refere é de sua infância nas ruas da Vila Cordenonsi, nas décadas de 80 e 90, época em que ele preferia almoçar na casa de amigos para ter “mistura” e não perdia oportunidade de “olhar carro” na missa e em eventos para juntar alguns trocados.

Hoje, reeleito vereador com um aumento de 75% no número de votos, o mais votado do partido pela segunda vez consecutiva, Thiago ocupa a posição de chefe do Poder Legislativo da cidade onde nasceu, cresceu e constituiu família. Tal posição, ainda que importante, não assusta o vereador, que contou ao TODODIA que se sente preparado diante das dificuldades que enfrentou na infância e juventude.

“Dificuldade hoje não vejo nenhuma. Difícil pra mim foi sobreviver, me manter, foi ter sido criado sem pai e mãe, sem estudo, foi ter engravidado minha namorada com 17 anos, hoje minha esposa, ter uma filha quando eu não tinha condição nenhuma”, afirma o presidente.

Thiago tem 39 anos e viveu na Cordenonsi até os 20. Lá, foi criado pela avó. A mãe de Thiago engravidou dele aos 15 anos. O pai não assumiu. Muito jovem e sem estrutura, a mãe acabou deixando Thiago com a avó e seguiu para Campinas em busca de oportunidades de trabalho junto do novo namorado, com quem se casou.

“Literalmente eu era um menino de rua. Não dormia na rua, mas todas as dificuldades eu passei. Saía de casa quando acordava e voltava pra dormir. Era muito mais fácil buscar algo diferente, até uma alimentação diferente, na casa dos amigos que na casa da avó”, conta.

Aos 10 anos, Thiago começou a trabalhar como flanelinha na Festa do Peão, que na época acontecia na Fidam, sem imaginar que décadas depois iria criar um dos camarotes mais importantes do evento, o Camarote Elite, que depois se tornou Camarote Americana. Aos 15, atuou como lavador de carros em um estacionamento, onde cinco anos mais tarde se tornaria encarregado.

Depois, entrou no mundo dos eventos, onde fez carreira antes de entrar para a política. “Sempre precisei buscar e conquistar o meu espaço onde eu estive. Na política não foi diferente”, afirma o presidente.

Agora, essas experiências o ajudarão na condução do Legislativo. “Nós temos 19 cabeças pensando diferente, 19 formadores de opinião que toda hora questionam. Isso não tem problema nenhum, porque cresci num meio muito pior. É mais um desafio, mas estou preparado”, cravou.

Transparência e modernidade, as metas

Logo nos primeiros dias, o novo presidente da Câmara solicitou à secretaria geral informações sobre todos os contratos e situação financeira da Casa. A meta é saber o que pode ser economizado e que investimentos são possíveis para modernizar o Legislativo. O objetivo é oferecer boas condições para que os trabalhos dos vereadores possam ser bem realizados.

“Quero ser lembrado por uma presidência transparente, moderna e próxima da população. Quero que a Câmara seja utilizada pra reuniões, exposições. O prédio, seja onde for, tem que ser casa do povo. Não precisa ser chique, mas tem que funcionar. Hoje tem locais com goteira, o som do plenário está ruim. É um prédio ruim de mobilidade”, afirmou Thiago.

O presidente não descarta retomar a ideia de construção de uma nova sede para a Câmara. “A Câmara não precisa ficar aqui, mesmo se tiver a permuta da área para o prédio ficar público, aqui pode acomodar vários outros setores, secretarias, porque a prefeitura paga aluguel para vários locais. Se isso se tornar um prédio público, pode colocar várias coisas aqui. A Câmara tem vida própria e tem recurso para construir um prédio próprio. Mas antes de dar um anúncio como esse, vamos analisar tudo”, concluiu.

Ao lado de Chico há 19 anos

Thiago Martins não nega que Chico Sardelli (PV) é seu padrinho político, em que pese garanta que, na presidência, marcará posição quando discordar de alguma medida – assim como discordava de Omar Najar (MDB) mesmo estando na base do prefeito. Fato é, no entanto, que a entrada de Thiago na política se deve muito ao trabalho que desenvolveu desde 2002 ao lado do tradicional político americanense, hoje prefeito da cidade.

Foram oito eleições disputadas no time de Chico. Thiago conta que começou como motorista de perua Kombi, passou pela coordenação de equipe de rua, coordenação das peruas Kombi, até efetivamente ser candidato em 2016 e conquistar a cadeira de vereador.

“Estive do lado dele quando ganhou e quando perdeu, seja pra prefeito ou deputado. Nunca sequer fiz outra campanha sem estar aliado a ele. Essa experiência, sempre acompanhando, vendo ele, entendendo a maneira dele na vida pública, despertou meu interesse. Teve uma pressão grande em 2012 pra eu ser candidato, mas não estava preparado”, contou Thiago.

Entre 2013 e 2014, ele atuou no departamento de trânsito na gestão Diego De Nadai, já arquitetando a candidatura em 2016. Agora, em 2020, Thiago conta que teve a oportunidade de participar de discussões do plano de governo e até da escolha do vice de Chico. De novo, a conquista de espaço.

“Uma das coisas que chama atenção no Chico é o diálogo. Ele conversa muito, diz que não é dono da razão. Porque hoje ele não precisaria ouvir ninguém. Mas não fez isso, ouviu, pediu opinião. Única coisa que ele falou foi ‘nós não podemos perder, é a eleição da vida, não aguento perder mais uma, essa eleição não podemos sair derrotados, só que vamos ganhar sem prejudicar ninguém’”, revelou o presidente da Câmara.

Mesmo com todo esse alinhamento, Thiago afirma que a Câmara não será um “puxadinho do prefeito”. “A Câmara tem independência. Chico é meu amigo, meu padrinho, mas se tiver que bater de frente com secretário, cobrar, vou fazer. Fiz isso com o Omar. Temos que tocar nosso trabalho”, afirmou.

LADO A LADO | Chico e Thiago Martins em 2008 (Foto: Arquivo Pessoal)

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