Testes conduzidos no Brasil com a vacina em desenvolvimento pela Universidade de Oxford e AstraZeneca contra a Covid-19 não tiveram até o momento relato de eventos adversos graves em voluntários, de acordo com a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
A informação, divulgada pela agência nesta quarta (9), ocorre um dia após a AstraZeneca anunciar uma suspensão temporária nos testes com a vacina devido à suspeita de uma reação adversa grave em um participante no Reino Unido.
Em nota, a Anvisa diz ter recebido o comunicado da AstraZeneca sobre a suspensão temporária dos testes da vacina ChAdOx1 nCoV-19 e que está acompanhando o caso.
A decisão foi tomada pela empresa até que o evento observado seja investigado. Ainda não há confirmação de que o caso tem relação com a vacina, o que deve ser avaliado.
Ainda em nota, a Anvisa informa que está em contato com o laboratório “para o acesso à totalidade das informações e interlocução com outras autoridades de medicamentos no mundo”.
O objetivo é verificar se o efeito inesperado tem relação com a vacina aplicada. A investigação ocorre por meio de um comitê independente de segurança, composto por pesquisadores internacionais não vinculados ao estudo.
“Este tipo de procedimento está previsto no desenvolvimento de vacinas, uma vez que esses estudos têm justamente o objetivo de confirmar a segurança e a eficácia das vacinas”, completa a Anvisa. “No Brasil, não há relato de eventos adversos graves em voluntários”, reforça a agência.
À reportagem o diretor-presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres, afirma que a suspensão pela AstraZeneca por suspeita de reação adversa ajudou a “testar” o sistema de segurança, o qual reagiu “em tempo adequado”. Para ele, embora não sejam desejáveis, casos como esses podem ocorrer em meio a estudos.
“Quando você tem uma testagem ampla em número de voluntários, apresentar um ou dois efeitos em determinados testadores faz parte do planejamento. Nenhum desenvolvedor poderá dizer que foi surpreendido com o surgimento de uma situação que requeira investigação”, afirma. “Não devemos achar que o que ocorreu foi ruim. Isso mostra que o sistema reagiu e identificou no tempo adequado.”
Ele frisa que ainda é cedo para dizer que há um nexo causal entre o caso e a aplicação da vacina. “Metade usa vacina e metade placebo. Será que esse participante tomou vacina ou placebo? Será que tinha uma condição predisponível antes? Isso tudo tem que ser investigado.”
Ainda segundo Barra, a situação não deve mudar os atuais protocolos para as demais vacinas ou prazos de análise. Questionado, ele afirma que a agência tem solicitado mais informações, mas que ainda não há previsão de conclusão das avaliações.
O aval para realização dos testes da vacina de Oxford no Brasil foi dado pela agência em junho deste ano.
No mundo, os testes envolvem cerca de 18 mil voluntários. Por aqui, a pesquisa é coordenada pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e envolve 5.000 voluntários.
Até o momento, muitos já receberam a segunda dose e não houve intercorrências graves, diz a universidade, segundo quem a medida segue os padrões de segurança preconizados no protocolo do estudo.
Segundo a Unifesp, novas aplicações da vacina estão suspensas, mas voluntários que já participam seguem em monitoramento.
A notícia da suspensão temporária dos testes foi divulgada inicialmente pelo Stat, site especializado em saúde e tecnologia.
O comunicado enviado pela AstraZeneca à Stat, no entanto, não deixa claro em qual braço do estudo ocorreu o evento, se no que recebeu a vacina ou no que recebeu placebo. A farmacêutica também não informou qual foi o evento adverso observado.
Segundo o jornal The New York Times, o problema foi detectado em um voluntário no Reino Unido. Ele teve um diagnóstico de mielite, síndrome inflamatória da espinha dorsal, muitas vezes causada por infecções virais. Ainda não é possível precisar, porém, se a síndrome foi causada pela vacina.
Especialistas têm dito que a paralisação nos estudos faz parte de um protocolo de segurança. Fontes que acompanham o processo para possível transferência de tecnologia e produção da vacina no Brasil, por meio da Fiocruz, também tratam a informação com cautela.
A avaliação é que, em estudos clínicos bem conduzidos, não é raro ter situações como essa, mas que os dados também não podem ser minimizados.
O governo havia aberto um crédito orçamentário de R$ 1,9 bilhão para que a Fiocruz pudesse receber as primeiras doses e participar da produção da vacina.
O acordo, em fase final de negociação, prevê a oferta de 100,4 milhões de doses da vacina. Destas, 30,4 milhões estariam disponíveis até janeiro, e o restante nos meses seguintes.
Em nota divulgada nesta terça (8), a Fiocruz disse que vai acompanhar os resultados das investigações sobre possível associação de efeito registrado com a vacina para se pronunciar oficialmente.